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terça-feira, 18 de outubro de 2011

Retratos, Relatos, Reminiscências



Vendo fotos antigas de Araruama, publicadas na forma de cartão postal, tive a idéia de, a partir delas, reunir lembranças e histórias que pudessem dar vida a esses cenários.
         São recordações que marcaram nossa infância e adolescência, numa época em que se nos ressentíamos de algum conforto oferecido mais tarde pelo progresso, éramos agraciados com vantagens incomparáveis, como a saúde da Lagoa, a tranqüilidade e a paz que só uma pequena cidade pode proporcionar.
         Revisitada a memória, muitas histórias foram tomando forma a partir de conversas, fotografias de família e amigos. Muito mais poderia ter sido contado e penso mesmo que seria um trabalho infinito. Pequenas lembranças vão se juntando a outras, como pequenos retalhos que se unem formando grandes painéis.
           S e de nada servirem, pelo menos poderei aproveitá-los mais tarde, quando a memória não estiver à disposição para aplacar os momentos de saudade.

       
                                   

   Desse cais que ficava em frente à atual rodoviária, saíam e chegavam os barcos, carregados de conchas extraídas da lagoa e sal trazido das salinas de Praia Seca, para o carregamento dos caminhões. Eram muitos homens de bermudas, com a camisa amarrada na cabeça, muito bronzeados pela ação contínua do sol e do sal.
   Esses barcos já faziam parte da paisagem e houve uma época em que um deles se transformou num restaurante flutuante. Era o “Comtic”, que pertencia a Leonardo Comte. Servia uma comida deliciosa, preparada por Leonardo, que era alegre, falante e gesticulava muito, como todos os italianos. Lembro que muitas vezes, levamos caniços, para de dentro do barco, tentar pescar aqueles peixinhos bem pequenos que existiam na lagoa. Era lindo ver o Comtic flutuando iluminado à noite, como um pequeno broche que enfeitava a paisagem.
Meu pai possuía um desses barcos que retirava conchas e uma vez nos levou para fazer o percurso. Acordamos muito cedo e assistimos ao nascer do sol, já de dentro do barco. A lagoa parecia um grande espelho e o silêncio da manhã só era quebrado pelo som do motor e dos pássaros que sobrevoavam a lagoa à procura de peixes.
Num determinado ponto, parado o barco, pudemos ver as conchas, que sugadas em grande quantidade do fundo da lagoa, caíam numa imensa peneira. Junto vinham pequenos peixes, camarões e me lembro que um daqueles homens, que trabalhava no barco, pegava os camarões, retirava as cabeças e os comia ainda vivos. Ficamos todos, horrorizados!
 Na volta fizemos um lanche dentro do barco, paramos para um mergulho e então voltamos pra casa. Foi um dia maravilhoso!
As conchas depois de retiradas da lagoa, seguiam de barco até a fábrica de farinha de ostras que meu pai comprou, em Ponte dos Leites.
Moinho



Moinho




Espalhamento das Conchas
Carregamento da Farinha de Ostras


 Era um grande prédio branco, que penso existir até hoje, onde no quintal, a concha era espalhada para secar, para depois ser levada para um grande moinho motorizado, onde se transformava em farinha de ostras.
O prédio ficava na rua principal de Ponte dos leites, junto à estação do trem e à rua lateral, conhecida como Travessa Lorette, assim denominada numa homenagem o antigo dono da fábrica.
 Uma história muito interessante desse tempo é que Seu Hamilton Mello e Seu Lorette eram muito amigos e possuindo o mesmo tipo de negócio, possuíam empregados que já haviam trabalhado nas duas fábricas. Um desses ex- funcionários, que havia trabalhado por muitos anos com os dois, se tratava de um tipo de matador de aluguel. Seu Hamilton, de brincadeira, perguntou a ele se aceitaria dar cabo de alguém que estava a lhe atrapalhar a vida e os negócios. O dito empregado, disse que há muito não fazia esse tipo de trabalho, mas que para Seu Hamilton, antigo patrão e grande amigo, não poderia recusar o "serviço". Acertaram o preço em duzentos contos.
Por se tratar de brincadeira, quando ele perguntava quem seria a vítima, Seu Hamilton desconversava e dizia que estava ainda estudando o momento propício, quando só então revelaria o nome do “coitado".
O homem, muito precisado do dinheiro, ofereceu a Seu Hamilton um bom desconto, deixando o serviço pela metade do preço, só para servir ao amigo. Então, uns dias depois, procurado insistentemente, pelo sujeito, Seu Hamilton resolveu revelar o nome da futura vítima, sabendo que se tratava de alguém, por quem o "matador", nutria grande respeito e consideração.
- É Lorette! Preciso que você acabe com ele!
- Ah! Seu Hamilton, respondeu ele. Seu Lorette é muito meu amigo e pra matá ele, num faço desconto não sinhô!

Obs:
A foto antiga foi retirada de cartão postal impresso pelo Aspergillus. 



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